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Decisões consolidadas do STJ impactam empresas do Simples Nacional

O Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, conhecido como Simples Nacional, abrange atualmente 23,8 milhões de contribuintes no Brasil, segundo dados da Receita Federal.
Disciplinado pela Lei Complementar 123/2006, esse regime tributário simplificado facilita o recolhimento e a fiscalização de tributos devidos por empresas de menor poder econômico. A empresa interessada, no entanto, deve cumprir alguns requisitos, como ter receita bruta anual de no máximo R$ 4,8 milhões, comprovar regularidade fiscal e não possuir débitos com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Diante do grande alcance do Simples Nacional, o STJ é frequentemente provocado a se manifestar acerca de questões como a extensão de seus benefícios e as possibilidades de isenção de determinados tributos. Esta reportagem traz um panorama com os principais entendimentos adotados pela corte.
Acesso negado a benefício fiscal do Perse
Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.283), a Primeira Seção fixou teses sobre as condições para que empresas do setor de eventos possam usufruir de benefício fiscal do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), instituído pela Lei 14.148/2021.
Em uma delas, foi definido que o contribuinte optante do Simples Nacional não pode se beneficiar da alíquota zero relativa ao Programa de Integração Social (PIS), à Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins), à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), prevista no Perse, considerando a vedação legal do artigo 24, parágrafo 1º, da Lei Complementar 123/2006.
A relatora do repetitivo, ministra Maria Thereza de Assis Moura, lembrou que esse dispositivo veda quaisquer alterações em alíquotas que modifiquem o valor de imposto ou contribuição apurado na forma do Simples Nacional.
“Tendo em vista o caráter opcional do regime simplificado, aos contribuintes não cabe invocar o princípio da igualdade para exigir o tratamento favorecido. A microempresa ou empresa de pequeno porte não é obrigada a recolher seus tributos pelo regime do Simples Nacional, podendo seguir os regimes não simplificados de tributação, se assim for de seu interesse. Logo, o benefício fiscal não pode ser estendido com base na isonomia.”
De acordo com a ministra, a vedação de cumulação é aplicável, ainda que não haja reprodução na legislação de regência do benefício fiscal. “Peremptória e inexorável, não é afastada por legislação excepcional ou temporária, como é o caso da Lei 14.148/2021, que trata de medidas de combate à pandemia da Covid-19”, concluiu.
Vedação à inclusão de débitos antigos no Simples Nacional
Para a Primeira Turma, a regra da retroatividade da lei mais benéfica não se aplica a débitos antigos no âmbito do Simples Nacional quando seus fatos geradores forem referentes a período em que havia vedação expressa à adoção desse sistema especial de recolhimento de impostos e contribuições. O entendimento se deu no julgamento do AREsp 2.191.098.
No processo, uma empresa da área de tecnologia buscava a aplicação retroativa da Lei Complementar 147/2014, que revogou hipótese de vedação à tributação pelo Simples Nacional em seu artigo 17, inciso XI. Ela ainda alegou que a lei, por ser mais benéfica, deveria ser aplicada de forma retroativa, nos termos do artigo 106 do Código Tributário Nacional (CTN).
Ao analisar o caso, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) já havia reconhecido a responsabilidade tributária dos sócios da empresa e o caráter intelectual de suas atividades de suporte técnico e assistência técnica de informática, de modo que a opção pela tributação pelo Simples Nacional esbarrava no impedimento do artigo 17, inciso XI, da Lei Complementar 123/2014 até a revogação desse inciso pela Lei Complementar 147/2014.
O ministro Paulo Sérgio Domingues, relator, observou que o acórdão do TRF4 seguiu a jurisprudência consolidada do STJ, a qual define que o artigo 106 do CTN só se aplica quando se trata de lei meramente interpretativa ou relacionada à infração e suas penalidades.
“Sendo assim, a previsão de aplicação retroativa de lei mais benéfica não se presta para embasar a pretensão de inclusão de débitos inadimplidos no âmbito do Simples Nacional quando se referem a fatos geradores ocorridos no período em que expressamente vedada a adoção da forma especial de recolhimento de impostos e contribuições disciplinada pela Lei Complementar 123/2006”, afirmou o ministro ao rejeitar o pedido da empresa.
FGTS é devido pelos optantes do Simples Nacional
A Segunda Turma entendeu, no REsp 1.635.047, que a contribuição ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), prevista no artigo 1º da Lei Complementar 110/2001, é devida pelos optantes do Simples Nacional.
No caso analisado, o contribuinte alegava, entre outros pontos, que o artigo 13, parágrafo 3º, da Lei Complementar 123/2006 dispensou expressamente as empresas do Simples do “pagamento das demais contribuições instituídas pela União”, entre elas o FGTS.
Ainda segundo ele, a incidência da contribuição para o FGTS prevista no parágrafo 1º, inciso VIII, do mesmo artigo seria referente à contribuição do artigo 15 da Lei 8.036/1990, sem natureza tributária, paga pelo empregador no valor de 8% sobre a remuneração de cada trabalhador, não se confundindo com a contribuição da LC 110/2001, de natureza tributária, correspondente a 10% sobre o saldo da conta do FGTS dos empregados despedidos sem justa causa.
O ministro Mauro Campbell Marques, relator, apontou que a solução para a aparente contradição verificada na Lei Complementar 123/2006 deveria considerar a finalidade dos dispositivos citados e a preservação da estabilidade dos vínculos jurídicos. Para isso, prosseguiu, era necessário manter a relação de continuidade entre o antigo sistema do Simples Federal e o atual Simples Nacional.
A contribuição ao FGTS prevista no artigo 1º da Lei Complementar 110/2001 está incluída na disciplina do artigo 13, parágrafo 1º, inciso XV, da LC 123/2006, que determina a incidência dos “demais tributos de competência da União”, e não na do artigo 13, parágrafo 3º, da mesma LC 123/2006, que dispensa “do pagamento das demais contribuições instituídas pela União”, havendo de ser cobrada das empresas optantes pelo Simples Nacional.”
“Em nenhum momento, seja na construção do Simples antigo, seja na construção do Simples Nacional, houve a intenção na própria lei do Simples de atingir os recursos destinados ao FGTS, tendo em vista a sua natureza social de amparo ao trabalhador. Tanto que a única contribuição destinada ao FGTS existente quando da publicação da Lei 9.317/1996 (contribuição prevista no artigo 15 da Lei 8.036/1990) teve a sua incidência preservada pelo artigo 3º, parágrafo 2º, alínea “g”, da Lei 9.317/1996“, esclareceu o relator
Para Campbell, se no regime antigo do Simples as empresas optantes não eram isentas da contribuição do artigo 1º da Lei Complementar 110/2001, não faria sentido algum entendê-las eximidas com a vigência do Simples Nacional, que adotou o mesmo regramento vigente anteriormente.
Falta de alvará não impede adesão ao Simples Nacional
Também sob relatoria do ministro Campbell, a Segunda Turma decidiu, por maioria de votos, que a ausência de alvará de funcionamento não é suficiente para impedir a inclusão de empresas no Simples Nacional. Para o colegiado, a falta do documento não pode ser tratada como irregularidade cadastral fiscal, sobretudo se a empresa estiver devidamente inscrita e em dia com os tributos devidos.
A discussão nesse caso (REsp 1.512.925) girou em torno da expressão “irregularidade em cadastro fiscal federal, municipal ou estadual”, prevista no inciso XVI do artigo 17 da LC 123/2006 para fins de vedação de opção ou impossibilidade de manutenção da empresa no Simples Nacional. A empresa recorrente foi impedida de ingressar e se manter no regime por não ter alvará de localização e funcionamento.
Segundo o relator, a expressão poderia indicar uma série de irregularidades em quaisquer cadastros de fiscalização da União, dos estados ou dos municípios, sendo impossível identificar, inicialmente, quais deles teriam natureza meramente administrativa ou natureza fiscal.
“A empresa foi impedida de ingressar e se manter no regime do Simples Nacional em razão da ausência de alvará de localização e funcionamento. Não parece razoável que a ausência do referido alvará trate de irregularidade cadastral fiscal”, avaliou o ministro.
Campbell explicou que, no âmbito federal, o termo “cadastro fiscal federal” diz respeito à relação de pessoas em situação de suspensão/cancelamento/inaptidão nos cadastros indicados do Ministério da Fazenda – Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e Cadastro Geral de Contribuintes (CGC)/Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ). Essas informações integram o cadastro informativo de créditos não quitados do setor público federal (Cadin), que contém o rol de pessoas físicas e jurídicas responsáveis por obrigações pecuniárias vencidas e não pagas, correspondendo também ao disposto no inciso V do artigo 17 da LC 123/2006.
Para o relator, como a falta de alvará de localização e funcionamento não corresponde a registro de crédito não quitado no âmbito municipal nem a registro de suspensão, cancelamento ou inaptidão do CPF/CGC/CNPJ (artigo 2º, I e II, da Lei 10.522/2002), ou documentos equivalentes municipais, “não há que se falar em irregularidade cadastral fiscal apta a ensejar sua exclusão do Simples Nacional”.
Base de cálculo do Simples Nacional não inclui gorjetas
Em mais um processo de relatoria do ministro Campbell (AREsp 2.381.899), a Segunda Turma reconheceu que as gorjetas não se incluem na base de cálculo do Simples Nacional.
O ministro ressaltou que, conforme a jurisprudência do STJ, as gorjetas não integram o preço do serviço para fins de incidência do Imposto sobre Serviços (ISS), devendo, portanto, ser excluídas da apuração do Simples Nacional dos prestadores de serviço. O relator lembrou que o artigo 18, parágrafo 3º, da Lei Complementar 123/2006 estipula que o Simples Nacional incide sobre a receita bruta do estabelecimento.
Para Campbell, pelas mesmas razões que é ilegítimo o recolhimento de PIS, Cofins, IRPJ e CSLL sobre a gorjeta, não se pode cogitar sua inclusão na base de cálculo do Simples Nacional.
Em relação ao mesmo assunto, a Primeira Turma, sob relatoria do ministro Gurgel de Faria, decidiu no AREsp 1.846.725 que “não se vislumbra nenhuma possibilidade” de considerar a gorjeta abarcada no conceito de receita bruta, que é a base de cálculo do Simples Nacional, como descrito pelo artigo 3º, parágrafo 1º, da Lei Complementar 123/2006.”
Optantes são isentos do pagamento do AFRMM
No REsp 1.988.618, a Segunda Turma decidiu que as micro e pequenas empresas optantes do Simples Nacional estão isentas do pagamento do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), contribuição federal cobrada sobre o frete marítimo nacional e internacional. A partir desse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso especial da União em ação promovida por uma empresa que buscava a restituição do AFRMM.
Fonte: Jornal Contábil